Dois ministros mantiveram cobrança fiscal; julgamento na 2ª Turma foi interrompido por pedido de vista
A 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) começou a julgar nesta semana uma acusação de terceirização irregular feita contra a empresa Lunelli Comércio do Vestuário, detentora, entre outras, das marcas Lez a Lez, Fico e Lunender. A Fazenda Nacional alega que a companhia promoveu uma terceirização artificial, criando empresas de fachada para continuar aproveitando benefícios tributários do Simples Nacional. Diante disso, a Receita Federal cobrou a contribuição previdenciária incidente sobre os salários dos empregados terceirizados.
Os ministros analisam o caso no REsp 1.652.347/SC, que opõe a Lunelli e a Fazenda Nacional. Por enquanto, dois ministros votaram para manter a cobrança fiscal de contribuição previdenciária e considerar que a companhia realizou uma terceirização irregular. O julgamento começou na última terça-feira (3/12) e foi retomado nesta quinta-feira (5/12), quando foi interrompido novamente por um pedido de vista.
A companhia é acusada de ter dividido a sua operação como forma de continuar usufruindo dos benefícios do Simples Nacional. A irregularidade estaria na contratação simulada de cinco empresas, que na realidade estariam ligadas à Lunelli. A fiscalização apontou, entre outros pontos, que as companhias contratadas teriam como sócios ex-funcionários da Lunelli, além de utilizarem maquinário cedido pela companhia.
Ainda segundo a Fazenda, a rede de empresas teria se organizado para pagar as contas de água e luz umas das outras e compartilhar o imóvel de sede e as linhas telefônicas. Por fim, a acusação argumenta que as empresas contratadas prestavam serviços exclusivamente para a Lunelli.
“Para ficar no simples a empresa dividiu-se”, sintetizou o Procurador-Geral da Fazenda Nacional, José Levi, durante sustentação oral realizada no dia 3.
Empresas de fachada?
Após identificar a suposta irregularidade a fiscalização cobrou da Lunelli a contribuição previdenciária incidente sobre a folha de salário dos funcionários das empresas contratadas. A cobrança em 2008 girava em torno de R$ 10 milhões, segundo o relator do caso. Fontes próximas ao processo, porém, estimam que o montante tenha mais do que dobrado de lá para cá.
A cobrança da contribuição previdenciária se deu após a fiscalização desconsiderar a personalidade jurídica das companhias contratadas. A Receita entendeu que existia relação de subordinação entre os funcionários das cinco companhias e a Lunelli.
Por outro lado, a Lunelli defendeu que a Receita Federal não forneceu provas suficientes para evidenciar a relação de emprego. Ainda, argumentou que os depoimentos das testemunhas demonstram que as empresas prestadoras de serviço são idôneas e autônomas, e não empresas de fachada.
De acordo com o contribuinte, as companhias prestavam serviços exclusivamente à Lunelli porque eram de pequeno porte e não tinham capacidade para atender a demandas de outros clientes, de forma que não havia qualquer exigência de exclusividade. A companhia também negou ter interferido na administração das pequenas empresas e ressaltou que a lei não impede que ex-empregados da Lunelli se tornem proprietários das empresas que venham a lhe prestar serviço.
Segundo o advogado da Lunelli, Carlos Amorim, do escritório Martinelli Advogados, é comum no setor que ex-funcionários deixem as empresas nas quais atuam e abram suas própria tecelagem. Além disso, por conta da sazonalidade, é usual que a produção dessas pequenas tecelagens sejam voltadas a um único comprador.
Por fim, o contribuinte destacou que, ainda que o Judiciário considere a terceirização irregular e decida que na verdade as empresas constituem um grupo econômico, não fica automaticamente autorizada a cobrança de contribuição previdenciária sobre os salários dos supostos terceirizados.
Isso porque seria necessário comprovar, adicionalmente, que os funcionários das “subsidiárias de fachada” também são empregados da Lunelli. Na visão do contribuinte, no entanto, não existe vínculo empregatício porque não estão atendidas as condições de pessoalidade, eventualidade, onerosidade e subordinação.
Votos
O relator do caso na 2ª Turma do STJ, ministro Francisco Falcão, considerou que a partir dos elementos trazidos pela fiscalização ficou comprovada a confusão patrimonial entre as companhias tratadas no processo. Existiria, assim, uma Ilicitude na terceirização, sendo possível a conclusão de que há vínculo empregatício direto entre os funcionários das empresas contratadas e a Lunelli.
O ministro Herman Benjamin, que preside a 2ª Turma, acompanhou o relator para entender que a terceirização é ilícita e que a Lunelli deve pagar a cobrança de contribuição previdenciária sobre os salários dos empregados. “Todas [as empresas] com confusão pessoal, patrimonial: luz, água, contadores. A única distinção é a jurídica. Uma formalidade”, disse.
Na sequência, o ministro Mauro Campbell afirmou que não conheceria a maior parte do recurso por aplicar a súmula 7 do STJ, conforme havia anunciado na terça-feira (3/12). O enunciado impede que o tribunal superior reavalie as provas apresentadas no processo, para que os ministros se debrucem apenas sobre questões de Direito relativas à aplicação da legislação federal.
Se o recurso não for conhecido pelo STJ, prevalece a decisão da segunda instância, que afastou a cobrança de contribuição previdenciária.
Durante a sessão desta quinta-feira (5/12), Campbell reforçou que a segunda instância decidiu de forma unânime que a desconsideração do negócio jurídico do contribuinte não autoriza que o Judiciário reconheça o vínculo empregatício por presunção. Isso porque, na visão dos desembargadores, a Receita não reuniu evidências que comprovassem a subordinação dos empregados, a não eventualidade da prestação dos serviços, a pessoalidade do trabalho e a remuneração entre as pessoas físicas prestadoras de serviço e a suposta empresa tomadora.
Após defender a aplicação da súmula 7, Campbell pediu vista para elaborar o voto no mérito caso os demais ministros entendam que o recurso deva ser admitido e ele seja vencido na parte do conhecimento.
A 2ª Turma é composta por cinco ministros, e além de Campbell aguardam para votar os ministros Og Fernandes e Assusete Magalhães.
Segunda instância
O caso chegou ao STJ após o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) analisar o assunto e proferir duas decisões distintas: uma favorável e uma desfavorável à empresa. Em 2015 a Corte manteve a cobrança fiscal, porém em 2016, por meio de embargos de declaração, o entendimento foi alterado.
Na decisão mais recente o TRF4 considerou que a fiscalização não comprovou o vínculo empregatício que embasaria a cobrança da contribuição previdenciária.
“Ainda que a nítida atuação da embargante [Lunelli] nas áreas de administração de pessoal, contábil e financeira das empresas contratadas, além da cedência de equipamentos e imóveis e do capital social reduzido, aponte a formação de grupo econômico, a exposição detalhada no Relatório Fiscal Complementar não corrobora, de modo inequívoco, a conclusão de que os empregados prestavam serviços sob as ordens da Lunender”, afirmou o desembargador Amaury Chaves de Athayde.
Fonte: Portal JOTA
BÁRBARA MENGARDO – Editora
JAMILE RACANICCI – Repórter